Dependência das experiências

A vida vitoriosa é uma existência sobrenatural; é um milagre vivo, uma aventura emocionante, porquanto é operação e actuação de Deus. Nossas primeiras experiências, na vida vitoriosa, geralmente são tão diferentes de qualquer coisa que conhecíamos antes, tão extraordinárias, como demonstrações sobrenaturais da graça e do poder de Deus, que imediatamente ficamos sujeitos a grave perigo. Esse perigo consiste de supormos equivocadamente que teremos, continuamente, de receber evidências emocionantes, inesperadas e sobrenaturais do poder de Deus. E então, se esses fenómenos sobrenaturais não ocorrerem, seremos tentados a pensar que algo está errado.

Ora, nosso Deus quer que confiemos, não nas experiências sobrenaturais, mas sim nEle mesmo. Compete a Ele decidir quando o invulgar deve suceder nas nossas vidas, e quando as nossas vidas devem correr suavemente, tropeçando apenas em coisas corriqueiras, pelo menos até onde diz respeito às coisas que nos atingem a vista e os sentidos.

Libertemo-nos também, do perigo de supormos inconscientemente que sempre sabemos qual é a vontade de Deus, de modo infalível. A orientação do Senhor pode ser tão bendita e tão inequívoca que, ao testificarmos aos outros sobre ela, diremos como "Deus disse isto ou aquilo para mim", ou como "Deu; levou-me a fazer isto ou aquilo". E então, se não estivermos vigilantes, empregaremos inadvertidamente essas expressões, que se tornarão habituais. Não é muito melhor que, ao invés de dizer: "Deus me disse para fazer isto ou aquilo", que o crente diga: "Creio que Deus quer eu faça isto"? Precisamos reconhecer que podemos estar equivocados. Ainda que tenhamos a plena certeza, em nossos corações e mentes, acerca da orientação de Deus, não fica bem reivindicarmos infalibilidade para nós mesmos, sem qualquer qualificação, em nossas conversas com outras pessoas.

As bênçãos que nos são propiciadas por Cristo, na vida vitoriosa - naquele "fruto do Espírito" (ver Gálatas 5:22,23) são tão maravilhosas que corremos o perigo de dar mais valor a elas do que Àquele que nos abençoa. A alegria pode tornar-se uma bênção tão bendita - aquela alegria sobrenatural que nada pode derrotá-la, e que é independente de todas as circunstâncias e ambientes - que, sem o percebermos, podemos valorizar mais a essa "alegria do Senhor" do que ao próprio Senhor Jesus. 

Ele anseia por nossa adoração a Ele mesmo, e não aos frutos do Espírito. Precisamos deveras daquela palavra de advertência atribuída a Spurgeon: "Olhei para Jesus, e a pomba da paz voou para dentro do meu coração. Olhei para a pomba da paz, e ela foi-se embora."
O crente que realmente confia no Senhor, para que obtenha a vitória, não demora a perceber que muitos crentes ao seu redor não possuem a mesma verdade da vitória, e que por isso mesmo não estão confiando em Cristo. Tal crente pode estar em contacto
com outros crentes, mais idosos, mais avançados do que ele mesmo em vários aspectos; mas que, no entanto, não estão vivendo dentro do segredo da vitória que lhe é tão precioso. E isso o expõe ao perigo do orgulho espiritual, quase que sem se aperceber  pode deixar escapar dos lábios palavras de crítica contra seus irmãos na fé, que não conheçam ainda esse segredo, ou pode proferir algum comentário de condescendência acerca dos erros ou falhas de outrem. "Sou mais santo do que tu" é um dos grandes perigos inerentes à vida vitoriosa. Naturalmente que no instante em que um crente assim se refere a outros, ou que assim pensa no coração sobre seus irmãos na fé, a sua vitória terá desaparecido; acaba de incorrer em pecado. Ora, é necessário que reconheçamos a existência desse perigo, se quisermos evitá-lo.

O crente verdadeiramente vitorioso fala sobre os seus irmãos sempre com humildade, plenamente consciente de sua própria pecaminosidade e inaptidão espiritual. E assim se expressa impelido pelo amor perfeito, que é gentil, que não exalta a si mesmo, que não se ufana, que não se porta com inconveniência, que não liga para o mal, mas que nunca falha (ver 1 Coríntios 13:4-8). Tudo é obra de Cristo - a honra e a vitória são inteiramente dEle. A vitória autêntica, por isso, deve-nos conservar na humildade; e assim efectivamente acontece.
Igualmente, o crente vitorioso corre o perigo de tornar-se incapaz de ser ensinado. Podemos aprender até mesmo pelos conselhos de pessoas perdidas, não-regeneradas! E com frequência assim sucede. A vida vitoriosa não serve de garantia de omnisciência, de infalibilidade no conhecimento das coisas espirituais. A humildade de espírito,
a prontidão em receber toda e qualquer crítica que alguém faça a nosso respeito, e então a aceitação agradecida de qualquer verdade que haja nessas críticas (e certamente haverá alguma verdade nelas), é nossa salvaguarda contra esse perigo inconsciente de não nos sujeitarmos aos ensinos de outrem.


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